A Casbah de Tânger, ou castelo daquela cidade, património de inegável valor arquitectónico, encontra-se numa situação deplorável. A sua fachada Norte colapsou parcialmente e está em risco de ruína total, ameaçando derrocada.
O imóvel integra-se na cintura de muralhas construída pelos portugueses durante os quase 200 anos em que aí permaneceram, resultado da reformulação da antiga cerca que já existia desde o século XII. A Casbah foi implantada no ponto mais alto da cidade, em situação sobranceira em relação à Medina, desfrutando de uma vista panorâmica sobre o Estreito de Gibraltar.
A falta de conservação e a instabilidade do talude em que assenta, são factores determinantes para a situação crítica a que a Casbah chegou.
A Casbah de Tânger em meados do século XX. foto Bernard Rouget
A cidade de Tânger era já fortemente fortificada à data da sua conquista pelos portugueses, como atesta Ruy de Pina na “Chronica d’el Rey D. Duarte”. No entanto os portugueses introduzem profundas alterações no seu sistema defensivo, “atalhando” as muralhas por forma a melhor controlarem a cidade e dotando-as de baluartes adaptados ás mais recentes técnicas da pirobalística, como a reformulação dos tramos Sul e Nascente por Francisco Danzilho, ou a construção do famoso Baluarte dos Fidalgos, intervenção dirigida pelo aquitecto Miguel de Arruda, que também modernizou a Cidadela.
A marca portuguesa dominante nas fortificações de Tânger é inegável, como atesta o próprio Ministério da Cultura de Marrocos no seu “Inventaire et Documentation du Patrimoine Culturel du Maroc”, ao afirmar que “a muralha actual data em grande parte da época portuguesa (1471-1661)”, apesar da pré-existência Islâmica e das intervenções subsequentes realizadas pela Inglaterra e pelos sultões Alauítas.
A Casbah no ano de 2009 . foto Abdellatif Achhab e Fier Marocain
No ano de 2009 a Casbah apresentava uma fissuração muito pronunciada, descolamento de paredes e desaprumos, evidenciando instabilidade da sua fundação, assente num talude que exigia uma intervenção de consolidação urgente. Várias pessoas chamaram a atenção para o a situação, mas a derrocada parcial aconteceria no ano seguinte.
Situação em 2010 . foto Abdellatif Achhab e Fier Marocain
Não se tendo realizado quaisquer trabalhos de reparação, no final de 2010 um tramo da Casbah acabou por ruir, retirando à construção o seu contraventamento estrutural e colocando-a em estado de derrocada eminente. Dado que se verifica uma fissuração generalizada dos panos edificados, deterioração dos seus rebocos e consequente exposição à acção de lavagem pelas águas das chuvas, os descolamentos e desaprumos irão acentuar-se e o risco de ruína agravar-se.
Em 2010 ainda houve uma tentativa de conter a derrocada da Bab Ar-Raha, porta situada no mesmo pano da muralha, através de um escoramento e tentativa de consolidação do talude, mas a porta acabaria por ruir também.
Situação em Novembro de 2014
O facto de o pano Norte das muralhas de Tânger assentar sobre um talude muito sujeito à acção das intempéries, na base do qual foi construída uma via rodoviária, que lhe imprime vibrações afectando a sua estabilidade, constitui um factor de aceleração das patologias que apresenta.
É fundamental uma intervenção de emergência neste imóvel, que para já sustenha a sua previsível derrocada, através da colocação de uma estrutura de contenção e escoramento, para que, paralelamente, sejam realizados os necessários estudos de diagnóstico e propostas de intervenção, e se leve a cabo uma acção de reconstrução, consolidação e reforço estrutural.
Situação em Novembro de 2014
Em 2011 foi lançada uma petição para tentar salvar a Casbah de Tânger, propondo a sua classificação a Património da Humanidade, iniciativa que parece não ter tido grande sucesso. Link http://www.causes.com/causes/615260-sauvons-la-casbah-de-tanger?recruiter_id=85780227
As obras actualmente em curso no pano Nascente da muralha
O pano Nascente da muralha de cidade está neste momento a sofrer uma intervenção de recuperação, integrada no âmbito da construção do novo porto de Tânger. Será que não faria sentido também canalizar verbas para evitar a morte da Casbah?
Bibliografia:
CARABELLI, Romeo. “L’Héritage Portugais au Maroc, un patrimoine d’actualité”. Mutual Heritage
MINISTERIO DA CULTURA DE MARROCOS. “Inventaire et Documentation du Patrimoine Culturel du Maroc. Remparts de la ville ancienne de Tanger”
PINA, Ruy de. “Chronica d’el Rey D. Duarte”. Gabriel Pereira, editor, Lisboa, 1901
Gostava de ter informações sobre o Programa de Aplicação do Acordo Cultural e Científico entre o Governo da República Portuguesa e o Governo do Reino de Marrocos, no domínio do Património e da Arquelogia em que as duas partes desenvolveram contatos entre o Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arquelógico, IP (IGESPAR, IP) e o CPML, com vista à criação de um museu do património luso-marroquino na antiga cidade portuguesa de El Jadida.
E o que se realizou da prospeção arqueológica partilhada, nos arredores dos locais e das grandes cidades de Marrocos de origem comum, com a participação do IGESPAR, IP e do CPML, visando uma carta arqueológica de todos os locais e localidades rurais marroquinos descritos nas fontes históricas dos séculos XV e XVI como tendo influência portuguesa?
Também a Fundação Calouste Gulbenkian recuperou e preservou património histórico português em várias latitudes, mas não sei se em Marrocos! É lamentável que este tão pouco se saiba o Portugal marroquino!
Começando pelo final do seu comentário, devo dizer que em Portugal faz-se um trabalho meritório no âmbito da investigação histórica, nomeadamente sobre a presença portuguesa em Marrocos, mas infelizmente essa informação fica na maior parte dos casos no segredo dos deuses (neste caso os deuses são as universidades). Ou seja, infelizmente não reverte em termos de conhecimento para o cidadão comum.
Em relação à Fundação Gulbenkian, para além de promover a divulgação do património de Portugal no Mundo (consulte-se o link http://www.hpip.org/def/pt/Homepage), no caso concreto de Marrocos, apoiou a recuperação da Torre de Menagem de Arzila, respondendo a um pedido do então Ministro da Cultura de Marrocos, Mohammed Benaíssa, para apoio técnico. O apoio técnico que inicialmente se referia apenas à cobertura acabou por se transformar no apoio total à recuperação da torre, técnico e financeiro. A própria estrutura do telhado e os caixilhos foram fabricados no Porto e transportados para Arzila para montagem. A intervenção foi entregue ao arquitecto Viana de Lima que faleceu antes dos trabalhos começarem, tendo sido de facto obra do arquitecto João Campos, então seu colaborador.
De referir também o trabalho meritório desenvolvido no âmbito do projecto “Portugal e o Sul de Marrocos: contactos e confrontos, séculos XV-XVIII (PTDC/HAH/71027/2006)”, do Centro de História de Além-Mar da FCSH – Universidade Nova de Lisboa e Universidade dos Açores e do Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória da Universidade do Minho (consulte-se o link http://www.cham.fcsh.unl.pt/ext/portugalemarrocos/portugalemarrocos.html)
Relativamente ao trabalho desenvolvido no âmbito do protocolo assinado com o Instituto Camões, que refere, não tenho qualquer informação