Tânger vista do Cabo Malabata
As Praças-fortes portuguesas em Marrocos organizavam-se de modo a subsistir num contexto extremamente hostil, frequentemente assediadas pelo inimigo e sujeitas a um bloqueio económico terrestre, o que levou os portugueses a abri-las para o Mar, de onde chegavam os abastecimentos e o auxílio militar, criando estruturas defensivas para garantir o controlo das frentes ribeirinhas, como as Couraças, e voltando costas à Terra, a fonte de todos os perigos.
No entanto, as Praças não podiam viver totalmente dissociadas do território envolvente, pelo menos daquele que se encontrava mais próximo. Era criado assim o chamado Campo Exterior, área extramuros de utilização diurna, defendida por elementos construídos de carácter precário aliados a procedimentos rotineiros, onde se recolhia lenha, se desenvolvia uma agricultura de subsistência e onde o pouco gado podia pastar.
Mas o Campo Exterior não era apenas isso, já que cumpria um papel muito importante enquanto escape à sensação de aprisionamento em que a população de encontrava, permitindo saídas fora de portas, especialmente necessárias para o equilíbrio psicológico dos habitantes.
Tanger, Alcácer Ceguer e Ceuta no contexto da costa do estreito de Gibraltar
Basicamente a situação de isolamento das Praças Portuguesas correspondia em teoria a um território envolvente despovoado, já que a acção das incursões de contra-guerrilha realizadas pelos chamados almogávares afastavam as aldeias anteriormente existentes, criando uma espécie de terra de ninguém, que se encontrava de certa forma instituída no acordo de paz de 1471 celebrado entre o Reino de Portugal e o Reino de Fez.
Este território era na prática um território disputado, já que tinha para os portugueses uma importância fundamental para a sua segurança e logística, e para os marroquinos enquanto zona de pressão sobre a vida diária das Praças Portugueses, onde podiam causar grandes danos com recurso a forças de reduzida dimensão.
“As praças, criaram em poucos anos, uma extensa zona despovoada ao seu redor, devido às contínuas razias e cavalgadas portuguesas, tão frequentes em todas as fronteiras medievais. O próprio cronista dos primeiros anos da Ceuta portuguesa, Gomes Eanes de Zurara, nos diz que toda a costa do Estreito, até chegar a Almarça (uns 13 Km a Oeste de Ceuta), ficou despovoada”. (GOZALBES CRAVIOTO, 1980, p. 150-151)
O limite da Cidade era claramente definido pela sua Muralha, com todo o conjunto de sistemas defensivos, como o Fosso ou Cava, os seus Baluartes e Torreões, Couraças, Revelins e Portas. Os elementos de contacto com o Mar, concretamente as Couraças, eram os fundamentais para a sobrevivência da Praça, totalmente dependente dos abastecimentos e ajuda militar via marítima, garantindo a supremacia e o controlo da Frente Ribeirinha e a segurança das operações de carga e descarga.
Tânger e o sistema de valos e tranqueiras do Campo Exterior Consolidado
Para permitir a já referida agricultura de subsistência, recolha de lenha e pastagem do gado, o sistema defensivo da cidade era complementado do lado de terra por uma defesa rudimentar que delimitava um território de ocupação diurna, no qual os tangerinos cultivavam alguns bens de primeira necessidade.
“Para proteger-se dos inesperados ataques das tropas dos Alcaides Marroquinos, e também das tribos armadas dos Berberes da região, os Tangerinos tinham construído diante das muralhas da cidade uma faixa defensiva semicircular composta de tranqueiras, e diante delas um parapeito de pedras amontoadas, o chamado ‘valo’ (…) Entre o valo e as muralhas da cidade cultivavam as suas hortas, que produziam algumas frutas, legumes e trigo”. (TEENSMA, 2008, p. 27)
Mas a estruturação desta área intra-valo, que podemos chamar de Campo Exterior Consolidado, era mais complexa, sendo formada por talhões delimitados por ruas definidas por outros muros de pedra solta, também chamadas mangas, encerradas em diversos pontos por uma espécie de portas construídas por paliçadas amovíveis de madeira, chamadas tranqueiras. Esta noção de Campo Exterior Consolidado é a mesma que foi posta em prática em Arzila e posteriormente em Mazagão, fazendo sentido que o modelo fosse replicado, até porque, como realça Robert Ricard, o sucesso da ocupação portuguesa das Praças dependia em muito deste conjunto de elementos combinados no quadro de uma ocupação restrita que, como afirma, os Ingleses nunca entenderam e, por esse motivo, abandonaram Tânger ao fim de pouco tempo após a receberem. (RICARD, 1933, p. 448)
Terreno delimitado por valos
As tranqueiras eram assim paliçadas de madeira colocadas em determinadas posições para evitar os ataques da cavalaria marroquina e permitir uma retirada em segurança seguindo o alerta dado pelas atalaias. Em redor de Tânger existiam inúmeras tranqueiras, cada uma com o seu nome, como a Tranqueira dos Pomares, a Tranqueira das Canas, a Tranqueira Nova, a Tranqueira de Angera, a Tranqueira de Benamenim, a Tranqueira do Verde, a Tranqueira dos Três Paus, a Tranqueira da Lagem ou a Tranqueirinha.
D. Fernando de Meneses na sua História de Tangere, esclarece a diferença entre os valos, muros de pedra solta que formam ruas, e as tranqueiras, paliçadas com a função de portas para fechar essas ruas:
“Por esta razão se fizeram fora da cidade valos de pedra que não pode passar a cavalaria com ruas, e tranqueiras nas bocas que se fecham, e outras nos meios para se sustentar melhor a fúria da cavalaria, formando-se em alguns lugares cómodos, e iminentes redutos, e mangas para pelejar a infantaria; e ainda que os Mouros desfazem algumas vezes estas obras, com facilidade se restauram”. (MENESES, 1732, p. 41)
Na obra de Elbl os valos construídos pelos portugueses não são apresentados como uma segunda barreira defensiva, mas sobretudo como protecções laterais dos caminhos de acesso à Porta do Campo, para além de alguns muros soltos. (ELBL, 2013, p. 117)
Elbl adianta que “uma parte substancial dos valos e tranqueiras na vizinhança da Porta do Campo/Catherine Port foram ou instalados ou ampliados enquanto Francisco Coelho serviu como capitão-mor em 1546-8 (…) O trabalho foi executado pelo mestre André Rodrigues e indirectamente supervisionado por Miguel de Arruda. Os trabalhos exteriores de Arruda em Ceuta foram usados como modelo (…) A espinha dorsal dos valos e tranqueiras, como a carta de Rodrigues de 1546 esclarece, eram faixas tácticas – caminhos ou entradas.” (ELBL, 2013, p. 204)
Foram assim trabalhos de ligação entre o Porta do Campo, e os Três Fachos e o Chafariz do Almirante, parcialmente pavimentados.
Planta “La Baye de Tanger en Barbarie” de Henry Michelot, de 1679, Bibliothèque Nationale de France, na qual se encontram representadas as “barreiras da cidade”. Nota: esta planta representa as barreiras da cidade durante o período da ocupação inglesa, não correspondendo às que os portugueses criaram
“Tacticamente e economicamente a totalidade da paisagem diante das muralhas faz todo o sentido, com os seus caminhos, valos, tranqueiras, e irrigação e locais de pastagem para o gado que tornaram o cultivo fora das muralhas possível e também serviu de reserva de pastagem no campo para a Cidade”. (ELBL, 2013, p. 206)
Numa carta de André Rodrigues a D. João III, datada de 1546, o Rei é informado que no âmbito destas obras foram colocadas quatro tranqueiras fechando os quatro principais caminhos de acesso à Cidade. E “fora das ditas tranqueiras fiz parede de pedra e barro”, indiciando a colocação de revelins para defesa das entradas dos caminhos. (CORREIA, 2008, p. 475)
Quanto aos revelins, baluartes exteriores a uma linha defensiva e de defesa das suas portas, realizados em terra batida, situavam-se na linha do valo, encerrando as suas tranqueiras, como sucedia em Mazagão. A própria Porta do Campo, representada nas gravuras de Hollar como dispondo de um forte revelim, não era assim no tempo dos portugueses, que iniciaram a sua construção, mas nunca a terminaram, como refere Elbl. (ELBL, 2013, p. 188). Nesta perspectiva, encaramos a referência de Luís Costa e Sousa ao Revelim dos Pomares frente à Porta do Campo (COSTA E SOUSA, 2015, p. 18), como a de uma estrutura defensiva extra-valos, até porque parece mais lógico que o posicionamento de uma força de cavalaria como a que descreve dificilmente seria operativa no meio de muros e tranqueiras, partindo do princípio é claro que a teoria (discutível) que aqui defendemos de uma área intra-valos consolidada é correcta.
Apropriação de Tânger pelos portugueses. Fonte Jorge Correia
O traçado do valo é neste artigo considerado como coincidente com o traçado da suposta Muralha pré-portuguesa que Jorge Correia defende na sua obra Implantação da Cidade Portuguesa no Norte de África. Da tomada de Ceuta a meados do século XVI, já que a própria configuração semicircular o pode indiciar, excepto no seu extremo Norte, em que termina no Mar, na chamada Falésia de Bouknadel. A construção dos atalhos pelos portugueses teria deixado vazio um território semi-urbano que pode ter cumprido esse papel fundamental no processo de sobrevivência da população, garantindo um mínimo de bens de primeira necessidade. Nesta perspectiva, o material demolido da anterior cerca, então desactivada, e dos edifícios que abrigava, não só teria sido utilizado para a construção dos atalhos, como também do valo.
A teoria de Jorge Correia, refere-se apenas ao atalhamento da cidade, já que o autor não equaciona graficamente o Campo Exterior de Tânger, pelo que se trata aqui de uma extrapolação entre uma teoria de implantação de uma cerca demolida para a da construção de um valo.
Refira-se que a teoria de Correia sobre o atalhamento da cidade levanta reservas na opinião da generalidade dos autores consultados, como Pedro Dias, Gozalbes Cravioto, El Boudjay, Martin Malcolm Elbl e mesmo Henri Terrasse, já que não está comprovado se a redução da cidade de 4.000 para 1.000 vizinhos após a ocupação portuguesa se tenha devido apenas a demolições realizadas no interior do perímetro fortificado, ou à redução efectiva do perímetro muralhado. Elbl coloca sistematicamente, na sua obra referenciada na bibliografia, a oposição entre os modelos da Little Tangier de Dias e da Big Tangier de Correia, sendo que Dias defende que a Cidade não foi reduzida em área, mas apenas desdensificada, enquanto Correia defende que Tânger perdeu cerca de 75% da sua área com o atalhamento português. (ELBL, 2013, p. 111-135)
Na aceitação da teoria de Jorge Correia como base para a implantação do valo, este distaria da Muralha cerca de 500 metros.
A Terra das Atalaias Curtas
No exterior do valo ficava o Campo Exterior, que, na sua área mais próxima da Cidade era controlado pelos portugueses, chamando-se a esta zona a Terra das Atalaias Curtas ou Terra dos Fachos. E “às colinas ocidentais daquele campo chamavam-se ‘os Pomares’. Era a partir dali que os Portugueses procuravam erva para os animais, e lenha para as cozinhas”. (TEENSMA, 2008, p. 27) O nome deste local é hoje Marshan.
Para Carlos Gozalbes Cravioto, este território poderia ter sido utilizado pelos portugueses como local de permanência diurna do gado, o qual era para ali conduzido através da Porta da Traição, que era no fundo o Albacar da cidade. O Albacar, designação que tem origem em Al-Abqar, As Vacas, era isso mesmo, a porta por onde o gado entrava e saía das cidades muralhadas:
“Nesta zona, os edifícios muçulmanos, arruinados com o tempo, deram lugar a um extenso terreno protegido pelas muralhas da cidade e ao qual as gravuras do século XVII nomeiam como “velho prado” (…) O terreno despovoado protegido pelas muralhas Poente da cidade ficou como recinto para guardar o gado.“ (GOZALBES CRAVIOTO, 1984, p. 81)
Esta localização do Albacar junto à Porta da Traição é contrariada por Martin Elbl, que o localiza do lado Sul da Cidade, num recinto encerrado especialmente criado para o efeito, sendo o acesso do gado ao exterior realizado por uma porta aí existente.
A Porta que liga hoje a Kasbah à Falésia de Bouknadel, junto ao antigo Baluarte de S. João
O campo exterior da Cidade era dividido em terços ou zonas defensivas e ofensivas com organização própria, confiadas a diferentes unidades militares. No texto de D. Fernando de Meneses são referidos vários terços, conforme o contexto militar em que se enquadram, como nas seguintes transcrições:
“A gente do campo, que são vinte e quatro Atalaias, seis Atalhadores, que servem de Atalaias do Cabo quando se toma serra; quatro Almocadéns; outros tantos Meirinhos, a quem tocam os quatro terços em que se divide o campo; um Almocadém del Rei, e estão todos à ordem do Adaíl (…) A Infantaria se repartiu em cinco Companhias a quem tocam cinco terços do muro, e mais obrigações de guardas. E vigias, em que há de haver mil soldados”. (MENESES, 1732, p. 39)
Mas quando se refere aos Fachos, D. Fernando divide o campo em três terços e descreve-os com precisão, mas logo de seguida confirma a existência de quatro terços de mar a mar:
“Fora dos valos em um monte de área há outros três fachos (para além da Torre do Castelo) que assistem dois facheiros quando se vai ao campo, e servem de dar rebate à Torre, e sinal da parte de que saem os Mouros, respondendo os três fachos aos três terços do campo Atalaínha, Meio e Xarfe. O dos Pomares governa outro facho que chamam Novo por diferença do Velho, que fica mais distante, e por este respeito se largou. A obrigação dos Atalaias é descobrir os quatro terços, em que de mar a mar se divide o campo”. (MENESES, 1732, p. 41)
A Torre de Tom ou de Gandori junto ao Cabo Malabata
Esta diferença entre Facho e Atalaia, transpondo para Tânger o princípio utilizado em Mazagão e Arzila, corresponde ao sistema de vigias situado na chamada Terra das Atalaias Curtas (Fachos) ou Campo Exterior Consolidado (estruturado por valos e tranqueiras e destinado a tarefas agrícolas e de pastagem de gado) e a Terra das Atalaias Longas (Atalaias), situadas na área de saída diária dos cavaleiros da Praça. Na prática, os Fachos eram estruturas muitas vezes construídas, como torres, e as Atalaias simples colinas de vigia das zonas mais afastadas. Junto ao Mar era frequente a construção de Torres, mesmo que afastadas da Cidade, pela facilidade com que eram socorridas via marítima.
Os Fachos não eram uma primeira linha de defesa da cidade, mas o sistema de vigilância próxima do seu Campo Exterior Consolidado, que, conforme referido anteriormente apenas tinha uma utilização diurna. Quanto às designações dos Terços, são inúmeras no relato de D. Fernando de Meneses, sedo as mais comuns, de acordo com Teemsna, os terços da Atalaínha, do Meio, da Praia e da Serra. Esta Terra das Atalaias Curtas teria um raio de cerca de um quilómetro.
O Cubelo de Vicente Fernandes, torre do pano Poente, confinante com o Campo Exterior
O trabalho realizado no exterior da cidade era acompanhado de perigos constantes, pelo que só se efectuava com o apoio dos atalaias, vigias que se posicionavam em pontos altos, geralmente no cume de colinas, vigiados pelos costas, tropa de apoio que ficava na sua rectaguarda, no sopé das mesmas colinas. Periodicamente eram feitas desmatações dos terrenos circundantes, para permitir uma melhor visibilidade e minimizar o perigo de emboscadas.
“Se os atalaias encontravam os seus postos fora de perigo, revelavam isso içando um feixe de feno no topo de uns mastros – “fachos” – bem visíveis da torre da cidade. O vigia – “facheiro” – da torre transmitia então o sinal “tudo seguro” ao Governador, o qual seguidamente mandava lá para fora as levas de homens que trabalhavam no campo. (…) Quando suspeitavam de perigo, os atalaias em campo desciam o feixe de palha do seu facho até o meio da haste. O facheiro central da torre da cidade imitava o gesto, repetindo o alarme visual acusticamente, por meio de badaladas de sino. Logo depois um canhão era disparado, cujos estampidos anunciavam o rebate em todo o contorno.” (TEENSMA, 2008, p. 28)
Alguns militares, chamados atalhadores, tinham por missão examinar os terrenos que separavam as atalaias da cidade. “Aos atalhadores competia descobrir os caminhos que levavam aos lugares onde se postavam as atalaias, para darem vista aos sítios perigosos ou propícios a ciladas, bem como observar os trilhos dos mouros e prevenir assim as suas surpresas.” (LOPES, [1937] 1989, p. 43)
Chamava-se a este sistema defensivo, que combinava defesas precárias com procedimentos rotineiros rígidos, segurar o campo.
Robert Ricard atribui a este sistema o sucesso da longevidade da ocupação portuguesa de Ceuta, Tânger e Mazagão, afirmando que “os Portugueses praticavam toda uma técnica que corrigia em parte os inconvenientes da ocupação restrita. Esta técnica consistia de um sistema complexo de vigias, sentinelas e batedores, que permitiam organizar a segurança dos arredores da praça durante parte do dia; esta operação chamava-se segurar o campo e, quando estava realizada, dizia-se que o campo estava seguro. Graças a esta organização, era possível assegurar o abastecimento da cidade, particularmente em água, madeira e forragem, e a liberdade da caça e da pastagem, sem ocupar propriamente o território, e consequentemente sem despender o esforço militar e financeiro que implica uma ocupação propriamente dita”. (RICARD, 1933, p. 448-449)
A Terra das Atalaias Longas
A chamada Terra das Atalaias Longas, definidora do Campo de Tânger teria em média uma légua de raio, ou cerca de cinco quilómetros. Apesar de a área considerada como a fronteira do Reino de Portugal, no quadro do espírito do Tratado de 1471, ter uma distância de cerca de 15 quilómetros das Praças, as descrições de D. Fernando de Meneses fora do Campo de Tânger são consideradas incursões na Berberia.
As Atalaias eram colinas de observação do terreno com o propósito de dar alerta à cidade assim que fosse detectado o mínimo movimento de tropas inimigas, e quanto mais cedo o detectassem, maior era a segurança com que a retirada do campo de fazia.
Um dos locais que merecia especial atenção dos Atalhadores de Tânger era o chamado lugar de Tânger o Velho, um conjunto de ruínas cuja origem tem estado envolta em polémica. Segundo os estudos mais recentes, trata-se de um complexo para construção naval edificado do século XIII, uma Taracenas, ligadas a um castelo que se situava no monte localizado a Sudoeste do mesmo, originário do século X-XI e hoje desaparecido, e designado Tânger Bayla, adaptação do nome Tânger o Velho. Estas ruínas provam que durante o período Merinida existia uma ocupação no centro da Baía de Tânger, mais tarde concentrada na actual localização da cidade. (GOZALBES CRAVIOTO, 2011, obra citada)
Ruínas das Taracenas de Tânger o Velho
“Segundo al-Bekri (século XI), a cidade de Tânger inicialmente esteve situada noutro lugar, tendo acontecido uma transferência: ‘A cidade está a uma cota mais elevada que a da localização da antiga Tânger, a qual foi invadida por areias’. Também nos assinala Albufeda no século XIV: ‘Os habitantes (da cidade de Tânger), fizeram uma nova cidade a uma milha da outra”. (GOZALBES CRAVIOTO, 2011, p. 60)
As defesas precárias e os procedimentos rotineiros eram complementados com a actividade de uma força de contra-guerrilha, os almogávares, que não só atacavam os aduadres vizinhos para incutir o terror nas populações e afastá-las o mais possível da Cidade, como para efectuar ações de pilhagem de gado e produtos agrícolas, e rapto de populações para trabalho escravo. O rapto de populações tinha grande relevância, já que permitia arrecadar grandes somas com os resgates feitos pelos alfaqueques.
A área de acção dos Almogávares de Tânger e o limite do Campo Exterior
Apesar de os abastecimentos à cidade serem feitos a partir de Portugal, os roubos realizados nos aduares vizinhos tinham uma importância decisiva, sobretudo ao nível do roubo de gado e alguns produtos agrícolas, como os cereais. A actividade dos almogávares, tropa de elite encarregue das entradas em território inimigo, constituída pelos mais moços e briosos, fazia-se geralmente com recurso a um almocadém mourisco, conhecedor do terreno. Essas incursões iniciavam-se ao cair da noite, com uma aproximação ao objectivo a coberto da escuridão e um ataque às primeiras horas do dia. O regresso era invariavelmente complicado, constantemente flagelado pelas investidas dos mouros e retardado pelo transporte do produto do roubo.
As informações sobre o inimigo eram tiradas à força aos cativos das almogavérias, mas haviam os chamados mouros de nova, traidores ao seu povo que em segredo vinham vender informações.
Os marroquinos montaram também um sistema de Atalaias para protecção das suas aldeias. “As razias lusitanas sobre as aldeias de região, obrigaram os muçulmanos a montar um sistema de vigilância em torres ou lugares de boa visibilidade, para avisar com tempo as aldeias dos ataques portugueses.” (GOZALBES CRAVIOTO, 1980, p. 181)
Os tangerinos pescavam na baía, entre a chamada Almadrava e Alcácer Ceguer, em barcos de pequeno calado, dispondo também de algumas galeotas para protecção dos pescadores e do comércio marítimo.
Uma cáfila junto ao Cabo Espartel, na Serra de S. João
Apesar do clima de guerra reinante, havia algum comércio feito através das cáfilas, nas quais viajavam os alfaqueques. “Também vinham de vez em quando de Alcácer Quibir as cáfilas – caravanas – com que mercadores marroquinos, judeus e cristãos viajavam pela região com salvo-conduto. (…) Sob a salvaguarda delas viajavam também os alfaqueques: funcionários oficialmente encarregados do resgate e recondução dos presos dos partidos beligerantes.” (TEENSMA, 2008, p. 31)
Muitos dos topónimos referidos nas crónicas são impossíveis de referenciar no terreno, como refere Benjamin Teensma no seu O Diário Tangerino de Afonso Fernandes, citando nas páginas Robert Ricard, que diz o seguinte na sua obra Études sur l’histoire des Portugais au Maroc:
“Em Ceuta como em Tânger e em Mazagão, os Portugueses elaboraram na sua língua e para seu uso pessoal toda uma toponímia particular: tanto evoca um aspecto da paisagem – por exemplo Cabeça Ruiva – tanto a lembrança de um fidalgo que se distinguiu nesse lugar, de um soldado que aí foi morto, etc., por exemplo o outeiro de Martim Gomes. Toda esta toponímia está hoje morta: é mais ou menos impossível actualmente determinar ao que corresponde no terreno, e é preciso resignarmo-nos a deixá-la de lado”. (TEENSMA, 2008, p. 50-51)
A Serra do Salto e o Jebel Mussa vistos do Cabo Malabata, com Alcácer Ceguer pelo meio
Como anexo transcreve-se o extenso Regimento do Campo de Tânger, pela relevância que tem em termos de procedimentos a seguir pela guarnição da Praça nas tarefas de segurar o campo, seja na inspecção do terreno pelos Atalhadores e posicionamento das Atalaias, seja nas incursões dos Almogávares. É relevante neste documento a parafernália de topónimos num território de tão reduzida dimensão e o facto de o rigor e a disciplina dos procedimentos poder reduzir o número de homens envolvidos a um mínimo, ao ponto de actuarem em grupos de dois, ainda por cima cumprindo missões em vários locais de acordo com uma sequência bem definida. O documento também é esclarecedor sobre a noção de fronteira entre o Campo de Tânger e o Reino de Fez, ao definir procedimentos para se fazerem entradas na chamada Berberia.
Tânger e por detrás a Serra de S. João
Reza o documento, integrado na História de Tangere, que compreende as notícias desde a sua primeira conquista até a sua ruína, de D. Fernando de Meneses, aqui adaptado a português actual:
“Regimento, que se há de ter no Campo de Tangere, e de que maneira se hão de mandar, e repartir os Atalaias, feito pelo Almocadém Braz Fernandes Couto, Cavaleiro da Ordem de Cristo, em idade de noventa anos; e se põe aqui para inteligência desta História.
Saindo-se pela Porta do Campo para fora há uma necessidade em tempo de muitos Mouros, de mandar Atalaia descobrir a Vila Velha, e o Corrego do Carrasco, e ficarem povoados ambos, o da Vila Velha em cima dando vista à praia.
E no Terço do Meio descobrir a Tranqueira do Verde, e ficar povoado no Canto do Chafariz do Almirante, e descobrir a Tranqueira da Silveirinha, e ficar nela povoado, e ir por dentro das hortas descobrir as mesmas hortas, e ficar Atalaia na Moayra, e descobrir a Pedreira, e estarem nela, e descobrir o Charcão, e as Terras de Leonardo Vaz, e ficar povoado na Tranqueira do Charcão.
Segundas Atalaias para os Três Paus
Mandar Atalaia descobrir a Fontinha, e a Boca do Almargem, e Agreda da Praia, e povoar os Três Paus, e os Atalaias do Meio descobrirão as Eiras do Bezugo, e a Cova de Aldeia, e o Palmeirinho do Meio, e ficarão povoados na Atalaínha da Bóbeda, e os do Terço da Atalaínha descobrirão o Brejo da Bóbeda, e a Volta de D. Pedro, e a Forcadinha, e ficarão povoados na Tranqueira Nova, e na Terra de Jorge Vieira, e os dos Pomares descobrirem a de Golife, e a Cova da Lagem, e a de Galas, e ficarão povoados na Tranqueira de Fora, e no Canto da Lagem.
Terceiras Atalaias para as Hortas
Os da Praia descobrirão o Palmarinho da Torre, e Atalaínha da Praia, e ficarão povoados no Palmarinho da Torre, e os do Meio descobrirão as Eiras do Bezugo, e o Palmarinho do Meio, e a Horta do Pão Seco, e ficarão povoados na Horta do Contador, e os do Terço da Atalaínha descobrirão a Terra de Aires Pinto, e a Cova de Araújo, e o Boquete, e as Palmeiras de Macieiro, e o Poço do Ginete, e o Palmarinho de Diogo Lopes, e a Horta da Serra, e ficarão povoados no dito posto da Horta, e no Palmarinho de Diogo Lopes, e os dos Pomares têm a obrigação que acima se declara, que fazem quando vão aos Três Paus.
Gravura de Tânger no séc. XVI da obra Civitates Orbis Terrarum de Braun e Hogenberg, 1572
Quartas Atalaias para o Xarfe e Meimão
Há de ir Atalaia da Praia descobrir a ponte de Tangere o Velho, e o Barrocal, e ficar povoado no mesmo Barrocal.
E o do Xarfe descobrir as Portelas, e o Facho do Xarfe, e a Cilada Grande, e a Mata Morra, e a de Peres, e o Porto de João Preto, e ficar povoado no Facho do Xarfe.
E a última há de descobrir a de Pedro Lourenço, e o Pontal da Eira, e ficar povoado na Eira.
E os do Meio hão de descobrir Benemenin, e o Meimãozinho, e a Cova do Meimão, e ficar no Porto do Meimão.
E o da Juda do Meimão há de ir à do Masmorreiro, e à Boca do Fronteiro, e ao Postinho, e à de Golife, e ajudar a fazer posto ao dito companheiro. E o da Aldeia irá descobrir a Eira, e povoará o Postinho.
E o da Terra de João Nunes há de descobrir a Lomba do Adail, e a Terra de Diogo Lopes, e a Terra de João Nunes, e a Pontinha, e as Covas de Fernando Álvares, e há de vir fazer posto na Lomba do Adail, com o companheiro que foi descobrir a Tranqueirinha, e a Pedra do Mouro, e a de Ribeiros.
E o da Atalaínha há de descobrir o Palmar, e a Fontinha, e Atalaínha, e os Pontais, e a Cilada das Figueiras, e a de António Gomes, e as Covas, e vir fazer o posto na Atalaínha com o seu companheiro que foi pelas Abóbadas e dar-lhe ajuda.
E o do Curral há de descobrir a de Artur de Leão, e a Cova de Gonçalo, e o Curral, e o Geestal, e Momo do Geestal, e povoar o dito Curral com seu companheiro.
E o da Ribeira há de descobrir a Forcadinha, e a Volta de D. Pedro, e o Forno da Cal, e o Parreiral, e a de Tinoco, e as Canas do Embandeirado, e fazer o posto no Palmar com o companheiro que foi descobrir o Barranco, e a Ribeira de Lançar.
E os dos Pomares, irá o da Ribeira descobrir o Facho, e a Cilada Grande, e Agreda, e o Porto dos Soldados, e a Ribeira por fora, ou por dentro, e fazer o posto na Cilada Grande.
E o que for da Rocha há de descobrir a de Galas, e a Cova do Serralheiro, e a Cova de D. Ruzel, e a de Pedro Machado, e há de vir fazer o posto ao Facho dos Pomares com o companheiro que lhe foi dar a vista ao Facho Velho, e à de Lourenço Fernandes.
Wenceslas Hollar – Tangier. Series title, University of Toronto. Nota: as gravuras que se apresentam de seguida correspondem ao período da ocupação inglesa da Cidade, pelo que o Campo Exterior já tinha características completamente distintas das que tivera durante a ocupação portuguesa
Para tomarem Atalaias da Aldeia
Se acrescenta além das do Xarfe, Meimão, e o da Eira de Pedro Lourenço, descobrir o Porto de Magoga, e estar povoado no Pontal da Eira, e no Terço do Meio: o do Meimão ir à Boca de Espalhafato, e à de Alafia, e fazer posto no Meimão com ajuda, que há de ir a Mendueira, e ao Almocovar de Benamaqueda.
E o da Aldeia descobrir Aldeia, e vir fazer posto na Eira com o companheiro que há de ir à Forcadinha, e à de Barboza, e ao Moinho de Vento.
E o da Lomba do Adail há de estar na Terra de João Nunes fazendo o posto com o companheiro que há de descobrir a Lomba Gorda, e o Paradão do Tasalho.
E no Terço da Atalaínha há de estar povoada a Cilada das Figueiras com o companheiro que há de descobrir a Silveira com os Charcões de Guilherme.
E o do Palmar há de estar no Pontal da Cilada das Figueiras com o companheiro que há de ir descobrir o Porto, e o Moinho de D. João Banha, e as Canas de Corvina, e para estar Atalaias da Aldeia são necessárias mais estas diligências além do Xarfe, e Meimão.
Para tomarem Campo de Lomba, e Benamaqueda
Hão de ir os da Praia descobrir as Tercenas, e o Castelo de Tangere o Velho, e o Barranco, e estarem povoados no Paradão de Tânger o Velho; o Castelo toca aos que forem da Ciza.
E no Terço do Meio: o do Meimão há de descobrir Benamaqueda, e o Porto de Gaspar Ribeiro com o companheiro que há de ir pelo Almocovar, dando vista à melhora da Aldeia, e povoar o posto de Banamaqueda, e o da Aldeia há de descobrir a de Vicente Fernandes, e a Lomba do Outeiro, e o Ribeiro das Atabuas, e estar povoado na Lomba do Outeiro com o companheiro que lhe foi dar ajuda.
O da Terra de João Nunes há de ir descobrir a Lomba do Corvo, e a de Fernando de Siqueira, e fazer posto na Lomba do Corvo.
E no Terço da Atalaínha o que for descobrir há de ir ao Outeiro das Lacras, e fazer posto na Cilada das Figueiras com seu companheiro.
E o que for descobrir o Curral há de ir ás Terras de André Banha, e fazer posto no Curral.
E o que for descobrir a Ribeira há de descobrir o Algueiral, e o Coute, e fazer posto no Pontal com o companheiro que vai ajuda.
E os dos Pomares, o que for à Cilada Grande há de descobrir as Casas de Domingues de Pontes, e a Ciladinha de Golife, e as Canas de Marques com o Outeiro do Vintém.
E o que for da de Pedro Machado há de ir a Rocha, e ao Ribeirão, e há de fazer posto com seu companheiro aonde é costume que é o Facho da Cilada Grande.
Tangier from the S.W. Gravura de Wenceslas Hollar, 1669-1671. University of Toronto
E para se tomarem Atalaias do Outeiro se acrescenta
No Terço da Praia, e da Eira há de descobrir Magoga, e a Estaquinha, e estar com o companheiro que foi ajuda, povoados na Estaquinha de Magoga.
E no Terço do Meio se acrescenta mais o da Lomba ir à Palmeira, e à de Gonçalo Coelho, e fazer posto na Palmeira com seu companheiro.
E os da Lomba do Corvo irem descobrir Outeiro, e fazer posto no mesmo Outeiro, e as Atalaias do Outeiro tomando-se com dois Atalhadores que venham amanhecer manhã não manhã na Cilada das Figueiras com a obrigação do Cabo feita, e uma Escuta que dê vista em Magoga, são seguras Atalaias, e proveitosas para a Cidade.
E querendo-se dar guarda à cidade, que importa tanto como uma dada de trigo, se acrescentam além das Atalaias do Outeiro, e da Praia, descobrir o Fornilho, e a Volta da Ribeira, e fazer posto no mesmo Fornilho, e na Volta da Ribeira, e sobre a de Palos Adão parte donde os Mouros podem arrancar, e cortarem o campo.
E na Alfarrobeira, e na Aldeadissa, e na de Estêvão Nunes com o Xarfe que cá de dentro lhe está tomando o rebate, e neste dia se busca para este posto do Xarfe um homem de muita confiança, e previsto.
E no Terço do Meio se acrescentam mais dois homens de fora irem tomar o posto de Benamaqueda, e as Atalaias do dito posto hão de descobrir Vale dos Iges, e o Paradão do Azeitado, e a Estriqueira, e a Pedra, quantidade de duas horas, e daí se virão povoar o Paradão do Azeitado por respeito que se estiverem todo o dia arrancam os Mouros muito perto com eles, e os podem embaraçar. E os dois a quem tocar o Outeiro, quando não forem homens que entendam o campo, se tirarão do dito Terço dois suficientes, e irão amanhecer no Penedo de Domingos de Pontes sobre a estrada, e daí darão vista se entra alguém para o Terço do Meio, e segurando-se, virão povoar o dito Outeiro, e os da Atalaínha o que for da Atalaínha há de ir povoar o Paradão do Galego, e estar nele povoado com o seu companheiro com muito cuidado olhando para uma melhora que vem do Poço de Álvaro Dias para Benahamed, e para uma melhora que vem da Aldeia de Manchea, e os que forem da Ribeira têm obrigação de descobrir a Boca de Sidamet encostados a Sena, e povoar Quiximi, e os do Curral descobrir a de D. Fernando, e o Paradão de Pedro Couseiro, e povoar no dito posto, e isto há de ser feito com lançarem no quarto da Lua sete Atalhadores que há na Cidade, para irem ver e cortar a estrada do poço de Álvaro Dias, e irem fazendo atalho até ao mar, e amanhecerão no mar, e segurando-se manhã clara virão cortando os caminhos por onde os Mouros entram para a Serra, e farão três postos em o dito Cabo, convém a saber, Aldeinha e a de Fernando Lopes, e o Salto, que em amanhecendo dá vista à Cidade, e estes três ocupam seis homens, e outro há de vir com a fala.
Prospect of the lower Part of Tangier. Gravura de Wenceslas Hollar, 1669-1671. University of Toronto
Até dar a um morador que se costuma ir tomá-la para daí se saber se está a Serra segura.
E os dos Pomares têm obrigação de povoarem S. João. E o Penedo Rachado, e com estas Atalaias, e diligências se tomam guardas que é grande o remédio para a Cidade.
E no dia que se tomar a dita Serra, podem entrar os Mouros por Vale de Pereiras, e a correr ao campo à Aldeia de Manchea, e podem arrancar da Palmeira de Benahamed, e a Atalaia que estiver no Paradão do Galego, há de ser dos mais velhos do Terço, e muito previsto, e não há de deixar do seu posto até Quiximi sair ninguém para fora a monte, e para isso hão de por os Generais grandes prevenções porque fazendo-se o contrário vão atrás dos povos até às ditas ciladas dos Mouros, e os podem tomar pela Redeá; e se um Capitão quiser armar aos Mouros um dia destes, pode fazer uma cilada na Aldainha de Diogo Lopes ou na de Fernão de Siqueira para que arrancando os Mouros de Benamed ou da de Manchea, ou da melhora do Poço de Álvaro Dias, e vindo após da Atalaia embebetidos pelas Eiras de João Martins, dentro não podem escapar por respeito de não trazerem cavalos, e para esta armação se fazer há de estar o General na Cilada das Figueiras com a gente de cavalo, que lhe restar, e os soldados que houver em Tânger com pólvora de resguardo para o que se oferecer, e quando se fizer esta armação é muito importante fazer-se num posto cá dentro nos Pomares no Facho Velho, porque aconteceu estarem fazendo esta armação, e ficarem os Mouros nas covas dos ditos Pomares, e matarem um homem que se vinha recolhendo pela de Pedro Machado para sua casa. E advirto que, por muito resguardo que haja no campo não está seguro, respeito de não ter portas, porque os Mouros dizem alfar mandexi albebe.
Wenceslas Hollar – The bowling green at Tangier, 1669-1671.University of Toronto
Advertindo que as guardas, que se tomarem não sejam de Junho até Setembro, senão de Outubro até Maio por respeito que nestes meses de do verão está o campo seco, e não se acha trilha, quando os Atalhadores vêm do Cabo para segurarem a Serra, e sendo coisa que a terra esteja muito falta de lenha neste meses de verão, pode mandar quatro homens à Ribeira, dois Ribeira abaixo, e dois Ribeira acima, e os que vierem Ribeira abaixo se hão de recolher por Bogudum, e dobrarem a serreta por dentro, e irem ao Cabo, e os dois da Ribeira acima recolherem-se pelo Furadouro de Cima, e virem ao Porto da Moita de Leão, recolhendo-se pelo Terço de Tangere o Velho, e vindo uns, e outros com novas à Cidade de que não tem cá entrado Mouros pode o General ir de melhora, e tomar guarda.
E se houver algum dia suspeita de entrarem alguns Mouros na Serra, podem mandar em uma barca lançar dois homens no Frade ou no Xarfe da Almadrava estar lá dois dias que são postos donde se segura a Serra, e sendo caso que haja nova de vir Alcaide ao campo ou às Aldeias todas podem mandar lançar dois que entendam o campo no Rio do Conde por mar, e irem por fora da Boca de Bogudum, e subirem por Vale de Pereiras até Benemagras, e porém se na Atalaia Gorda donde vêm os postos da Ribeira por onde é forçado entrarem os Mouros, e daí vem a gente que entra toda, e vem com a nova à Cidade para estarem precatados para o que suceder. Estas advertências importam muito fazerem-se de maneira que se declara para bem de tomarem campo seguramente.
The settlement at Whitby, W of Tangier, Wenceslaus Hollar, 1669, The British Museum
Ordem para se fazerem entradas à Berberia
Cujas partes são Guadalião, Angera, Benaulente, o campo de Guadares, e o de Gibelfaras, e Benarsem, Titalhaombra, Algomez, Grigis, Casmude e Portalfrexe.
Querendo um Capitão ir entrar a Guadalião, pode lançar numa barca dois ou três homens por mar no dito campo que saibam bem a terra, e estarem lá dois dias copiando, e trazendo novas que à pressa pode partir o Capitão de Tangere com toda a gente de cavalo, e soldadesca que é de muita importância neste Terço, com duas cavalgaduras de pólvora caminho do Rio toda a Praia na mão, e passarem os de cavalo o Rio da outra banda, os soldados nas ancas, e dali subirão por longo da Torre do Fornilho, e todo o caminho de Palos Adão na mão direita da Sumada, e levará cinquenta enxadas, e picaretas para fazerem caminho que da outra banda da Sumada vai ter a uns Ribeiros alcantilados, e numa parte destes Ribeiros onde parece melhor poder ficar com os seus soldados, e entrarem os corredores no Campo de Guadalião para daí correrem a preza, e se virão recolhendo ao seu Adail que com a gente junta num alto estará aguardando, e juntos se recolherão ao seu General que no passo por onde se há de recolher os estará aguardando, e juntos virão postos em ordem recolhendo-se por onde foram, e advirto quando se faça esta entrada neste lugar que se não perde nada mandar quatro homens à Ribeira para mais segurança.
E querendo ir a Benaíssa, Campo de Angera, a tomar Mouros, e gado, e de caminho Armar ao Xate, pode sair com toda a gente de pé, e de cavalo providos de pólvora em tocando a primeira se forem noites de inverno, e passar o Porto de Fernando Meirinho, e entrar pelas tercenas caminho dos Enteirinhos à Alfarrobeira por baixo dela, e irão sair ao Arraial da Aldeia Alta entre a de Peligio, e passando os Ribeiros que vêm da Garganta Alta se irão meter na Moita de Mafamede, e ali ficará o Capitão com a gente de cavalo, e de pé entrará o Adail as horas necessárias com cento de cavalo, toda a melhora na mão caminho do Porto de Benaíssa, e do Porto para fora correrão a preza, e os Almocadens nomeados com cinquenta de cavalo, e correndo a preza se recolherão ao Porto onde acharão o Adail com outros cinquenta, e se virão marchando encostados à Terra de Romão a sair ao Outeiro dos Infantes, como coisa que não são mais que aqueles cento de cavalo, e logo nas costas da gente de cavalo destes que vem com a preza acode o Xate que é senhor daqueles campos, com coisa de trinta de cavalo, e cento de pé que são os que ao mais breve se acham com ele, e entrando do Porto da Ribeira para dentro se encostarão num morro alto donde se seguram, e vem com duas Atalaias diante pouca quantidade em demanda da Moita de Mafamede donde lhe pode sair o Capitão com a gente de cavalo que tem consigo de refresco, e voltar o Adail que vem com a preza pela ilharga do Romão até ao Porto de Benaíssa não pode nenhum escapar respeito de não haver brenhas donde se metam, e dali se virão recolhendo em demanda dos seus soldados que com a preza hão de ficar, e se virão saindo ao campo, e treparão pela Aldeia Alta acima, e descerão por ela abaixo deixando Aldeia dita à mão esquerda com o resto na de Caparrota ao Esteio de Rui Pires em demanda do Porto de João Preto com todo o resguardo que se requere.
View from Peterborough Tower, Tangier Castle; prospect to the SW, over undulating country, with outlying forts, in the foreground a bastion with red-coated soldiers conversing, to the left part of the town and its fortifications, including Catherine Fort, and on the extreme left the bay, to the right a party of musketeers on the path leading to Henrietta Fort, and below on the extremer, Whitby Mole and the Atlantic Ocean, Wenceslaus Hollar, 1669, The British Museum
E para mais seguro fazendo-se esta entrada, podem mandar três homens de consideração ao morro que está sobre a Ribeira de Banaíssa a espiar ou à outra serra que fica da banda do Picacho de Guadalião, a estes homens os levarão três de cavalo alcançados por cima do Porto da Volta da Ribeira ao pé da Garganta Alta por respeito que se vierem Mouros armar ao Barrocal como muitas vezes sucede, se não ache a trilha mais que a ida, e vinda dos de cavalo, porque nunca ninguém perdeu fazendo as coisas sobre seguro.
E querendo-se ir entrar ao Campo de Benaulente, e Guardazes, e Gibelferas, e termo de Benarxem, pode o Capitão sair com a gente de cavalo a prima noite pela Boca da Portela ao Porto de Magoga encostados a Gredá, e sair em cima defronte da de Estêvão Nunes deixando o Vale de Mealha à mão esquerda, irão em demanda da Moita do Leão, e dois homens do campo que vão diante um pedaço para que não sejam sentidos, e saindo da Moita do Leão podem tomar uma folga encostados à mão direita da Moita de Isabel Correia que é terra de muita água, e na retaguarda doze homens de consideração por respeito que não vão pela trilha, alguma gente que no campo esteja armando e deem na nossa estando tomando a folga, e sendo horas para poderem caminhar irão por baixo da Lomba dos Pardais, e passarão um Ribeiro que vem da dita Lomba bem acima à mão direita, e passando o dito Ribeiro se irão encostando às Fraldas de Nazaré, e dobrando Nazaré lá em cima buscando o Porto do Furadouro que está dali perto, e passando se cozerão com a Ribeira à mão esquerda, e se irão meter num caboco que está da outra banda da Ribeira à mão esquerda do dito Porto, e dali apartarão quinze de cavalo, e osmandarão à Safa com um homem de muita confiança, e na dita Safa hão de fazer três postos porque não pode o Capitão estar neste lugar sem ter a Safa por sua, e sendo horas das oito para as nove, que é tempo em que os Mouros vêm às sua cearas, e os gados a comer, apartarão duas quadrilhas cada uma delas de quarenta homens, e lançarão uma à mão esquerda pelas Fraldas de Benaulente entrando de melhora, e a outra por dentro do Outeiro de D. João com dois Almocadens alentados em demanda do Porto do Freixo, e passarão, e irão cozidos com a Ribeira até serem sentidos das Atalaias dos Mouros, e dando-lhe rebate correrão a preza que sempre se alcança gado, e Mouros, antes de chegarem às serras, e enquanto os corredores andarem lá dentro se porá o Adail no alto de um morro que está no Cabo da Ribeira do Freixo, e o Capitão se porá com a Ala de gente que levar por cima do Arraial do Freixo fazendo outro alto, e recolhendo-se os corredores, e o Adail se virão todos em demanda do Capitão, e virão recolhendo-se ao Furadouro de Cima por entre o Outeiro de D. João, e a Safa entrando da Ribeira para dentro virão dois homens diante a povoar a Lomba dos Pardais, e por ela abaixo se recolherão em demanda dos Pardieiros de João de Lapenha encostados entre a Boca de Vale de Porcas, e a Ribeira, e virão em demanda do Porto das Canas caminho do Porto de António Correia, e entrarão por entre o pontal da Eira, e o Meimãozinho trazendo-os Deus com saúde faço lembrança que se não perde nada quando queiram fazer uma entrada como esta irão quatro homens à Ribeira, e vindo com o recado do que houver, que para uma coisa de tanta importância, em que se arrisca uma Cidade são necessário todas as prevenções, que quem adiante não olha, atrás fica.
A Bab Fahss, antiga Porta do Campo
E querendo entrar nos campos de Sitalhaombra, que são as Lombas Altas, e a Xexia, e as terras que estão nas Lombas Altas descendo até ao Porto de Sitalhaombra sairá o Capitão com sua gente de cavalo com ordem por entre o Pontal da Eira, e o Meimão, e passando o Porto de António Correia endireitará com a Terra da Estriqueira, e deixando-a à mão direita entrarão pela Boca de Vale dos Iges até emparelhar lá acima com a de Zuzarte Machado, e deixando-a à mão direita, cruzando aquelas terras todas que descem da Atalaia do Judeu irá ter a um Ribeiro que vem da Água de Todo o Ano, e ao longo dele pode tomar uma folga, e sendo horas de caminharem irão em demanda do Porto de Duarte Belo, e passarão a outra banda, e se encontrarão à mão esquerda, e se irão meter num canto da Ribeira que vem do Freixo onde cabe um arraial de gente, e ali se apearão tendo todos conta com os seus cavalos que não relinchem, e porão duas espias num morro conhecido que está sobre a Ribeira que é onde chamam as Orifias de a Lafiá vendo-se entrar o Atalhador dos Mouros entre as Lombas Altas, e a Ribeira de Xebe, e sendo horas que possa o gado estar pascendo, e os Mouros em suas lavouras, se porão todos a cavalo, e se farão duas quadrilhas, cada uma de cinquenta de cavalo com os dois Almocadens que se ordenarem, e um se lançará à mão esquerda cozidos com a Ribeira tratando, e galopando com os cavalos até à Ribeira do Porto do Freixo, e chegando do dito Porto safarão da Ribeira, e irão com o rosto por fora das Lombas Altas a uma baliza que ali está que é uma fonte com uma figueira, e chegando a ela descerão aqueles campos todos até ao Porto da Ribeira de Sitalhaombra, e dali para lá não passarão que correm grande risco, e a outra quadrilha se apartará à mão direita por entre as Lombas Altas, e a Ribeira de Xebe, e irão sair por baixo do Morro de Gregis até uma Ribeira que se diz Algorixá, e dali não passarão, e o Adail com a gente que lhe tocar se porá num morro que está por fora das Lombas Altas à vista do seu Capitão até se recolherem todos a ele com a preza ou sem ela, e dali virão marchando com sua ordem em demanda das Urifias até à Afáfia entrando pelo Porto de Duarte Belo, e virão em demanda do Furadouro de Baixo, e passando a Ribeira do Furadouro mandarão dois homens dos Pardieiros de Diamus a tomar vista do nosso campo, e em chegando o Capitão a Diamus se virá marchando em demanda da Forcada trazendo a gente junta consigo, e advirto que não se de largueza para montear porque vindo-se recolhendo da Pedra para a Estriqueira para dentro mandará uma Atalaia povoar o Meimão, e outra o Xarfe até ele entrar na Eira de Pedro Lourenço para dentro, e quando uma entrada como esta se fizer convém muito irem quatro homens fora dois ao Arraial de Ramele, e dois aos Arraiais de Seguidili que são partes onde os Mouros vem dormir quando vem das suas Aldeias correr aos campos dos Cristãos, e tudo isto convém fazer-se.
Tânger vista de Sul
E querendo ir dar numas casas em Gregis ou em Casmude estando vendidas por Almocadens que as tenham espiado para falsar as espias dos Mouros é necessário entrar um Capitão com sua gente pela Boca do Espalhafato à Prainha de Gonçalo Coelho, e saindo aos Charcões de Manuel Meirinho se encostarão a uma terra que vem da Aldeinha de António Pires, e dali irão em demanda à Boca dos Corchos, e chegando à Boca dos Corchos se ampararão com um morro que está da outra banda de Diamuz, e passado um Ribeiro que está antes do dito morro podem tomar uma folga. Tomada deixando o morro à mão esquerda, a Aldeinha de D. João que lá por baixo do morro fica endireitarão com a Ribeira, e chegando a ela da banda de cá está um morro, e ao pé dele buscarão o Porto de Barraxá, e passando os paus da outra banda buscarão à mão direita a Ribeira de Ramele, e irão por ela acima até um porto que está lá cima no Cabo da dita Ribeira que fica defronte de Casmude, e ali se apartará a gente que há de ir dar nas casas, e manhã não manhã cercarão as casas, e se apeará metade da gente a entrar nelas, e a outra metade ficará com os cavalos, e fazendo a preza se virão caminho do Porto de Ramele a juntar-se com a de mais gente, e se virão afastando da Ribeira recolhendo-se pela banda do Xebe às lombas de Gonçalo Anes em demanda do Porto Largo caminho da Aldeinha de D. João trepando a Diamus com suas Atalaias diante virão em demanda da Forcada caminho da Pedra, e a Estriqueira a meter-se na Cidade.
Farol do Cabo Espartel na Serra de S. João ou do Cabo
E querendo o Capitão ir correr o Campo do Farrobo, e Boca de Chaochão Terra de Portalfrexe pode ir pelo caminho acima declarado, e saindo por fora da Boca dos Corchos irá em demanda da Ribeira, e chegando a ela buscarão o Porto da Forcadinha de Francisco Botelho, e passarão à outra banda de Xarão toda a terra da dita Forcadinha à mão direita, e se enfiarão com Sugaire, e subirão a serra do dito Sugaire, e nela estão duas matas de Souros muito grandes, e se meterá a gente numa moita que fica mais de fora, e se apearão todos tendo conta que os cavalos não relinchem por respeito que fica logo por cima de Casmude, e Tempalhotas, e Colmeias de lavradores, e porão suas espias como convém, umas espiando para fora, e outras para dentro sobre a trilha, e estando apercebidos como convém lhes pode Deus dar tal ventura que se for numa ocasião de segunda feira ou sábado venham entrando Mouros do Farrobo toda a estrada na mão em demanda do Porto de Nafiza donde lhe podem sair a eles, e ser um dia de muita vitória, e quando não suceda este encontro se porão todos a cavalo das sete para as oito recolhendo suas espias a si que por fora estão postas: farão duas quadrilhas de gente de cavalo, e uma irá correr encostados à mão esquerda em demanda da Boca de Chaochão, e dali para lá não passarão porque correm muito risco, e outra quadrilha sairá em demanda da Serra de Protalfexe e o Adail se irá por defronte dos Arraiais de Siguidili num alto que ali está à vista dos Corredores, e o capitão atravessará a estrada com a demais gente, e se irá por da outra banda dos currais à vista do Adail, e tomando-se preza virão os Corredores com os seus Almocadens em demanda do Adail, e se virão recolhendo para o Porto de Nafiza, e entrarão pelo Sovereirinho deixando a mão esquerda, e virão ter ao Poço de Álvaro Dias, e deixando a Lomba de Mata Mouros à mão esquerda toda a estrada na mão ao Penedo de Domingos de Pontes com duas Atalaias, que hão de vir diante povoar o Outeiro, e faço lembrança, que importa muito não consentir o Capitão venha ninguém monteando porque entrando do Outeiro para dentro se pode dar com os Mouros que estejam no nosso campo armando, e haver um desarranjo, e se virão recolhendo em demanda da Lomba do Corvo ao Moinho de Vento pela de Barbosa a Forcadinha a pontinha da Terra de João Nunes em demandas dos Tanques para suas casas, e lembro que na mesma noite, que esta entrada se for fazer mandem dois Atalhadores ao Cabo, e vão por Bogudum à Lomba da Fala, e se cozam com a Ribeira em demanda do Porto da Forcadinha de Francisco Botelho para virem com nova antes, que entrem na Serra de Sugaire para mais segurança.
Não se trata aqui de um lugar da outra banda de Chaochão que se chama Barjacamar, e Almansorá, e seu campo por respeito que é necessário para ir um Capitão a essa parte com novecentos soldados, e quinhentos de cavalos porque há veredas de matos muito ruins, que toda esta gente se há mister para se tirar dali preza porque acode ali muita gente de pé a rebate tomar os ditos passos.
Nem se trata do Campo da Beleta aqui por respeito de um rio por nome Tagadarte que é um fero braço de mar caudaloso que todos os Generais o tentaram, e nenhum se atreveu pelo perigo, que nele pode suceder.
Mulheres Rifenhas
Ordem para os Capitães poderem ir montear, e desenfadarem-se
Podem sair no quarto da Lua com toda a gente de cavalo pela Tranqueira da Abóbada fora em demanda do Tabual às Tramagueiras caminho do Penedo à Ponta da Lomba Gorda aos Charcões de Guilherme por dentro das Eiras de João Martins entre Quexemi, e o salto todo, caminho da Aldeia do Campo entre Bogudum, e a Ferreta em demanda do Sovereiral da Fonte de Fegueira onde há muito porco do monte, e muitas alagunas de água com muita caça, e Gibelharo com uma fonte de água muito formosa, e a seneta que está sobre Tagadarte donde se vê uma praia que vai até Arzila e um desenfado muito grande, em todo o Campo de Maramar não há terra de tanto desenfado, e a vinda recolhendo pelo mesmo caminho que foram com resguardo todos juntos porque não há que fiar em inimigos.
Neste Campo de Tangere neste lugar acima dito de desenfados com outro que se diz Cabo de Espartel querendo o Capitão ir-se desenfadar a ele, e ver toda a cerca de princípio até o Cabo é terra de muito marisco, e palmitos, e porcos de monte, leões, muitas perdizes, e coelhos.
Pode sair o Capitão com toda a gente de cavalo pela Volta de D. Pedro abaixo em demanda do Rio ao Forno da Cal, e trepando ao Brejo subir a S. João em demanda da Areinhá todo caminho de Muley Abrahem a mira caminho dos Penedos dos Almoxarifes chegando à Nora deixará o Caminho dos Palheiros à mão esquerda, e descerá entre a Moita do Búzio ao salto do Surdo com o rosto ao Castelo da Almadrava, e vendo o Castelo, e o dito Cabo, e desefandando-se a gente toda virão recolhendo-se em demanda do Porto da Aldeinha onde há de estar uma Atalaia enquanto lá estiver desefandando-se, e dali virão ao Ribeiro de Matuto, e passando o Ribeiro se virão em demanda do salto por baixo da Aldeinha de Diogo Lopes em demanda das Eiras de Gramatão Galas ao posto da Cilada das Figueiras, e não ficará nenhum Cavaleiro por detrás fazendo cardos porque se aconteceu uns homens apearem-se, e correrem os Mouros da de Francisco de Meneses, e matarem um, e cativarem outro, e assim é bom virem para suas casas todos juntos com resguardo acompanhando o seu Capitão.
Faço aqui uma advertência considerando, que todas as prevenções são boas, e debaixo de se terem feitas sendo caso que suceda desventura, (e que não pode ser) não ficará lugar que se diga se se fizera isto não sucedera, e é que querendo-se tomar serra sem embargo dos Atalhadores terem feito sua obrigação faço lembrança que se atalhe a serra com dois homens de pé cortando-a de maneira, que se a caso estiverem nela Mouros para efeito de saírem com seu intento fica de muita consideração, e utilidade cortarem os dois homens de pé a serra porque aconteceu meter-se nela Bentude com gente onde esteve dois meses aguardando uma só hora, e fê-lo com tanto segredo, e resguardo que de Arzila lhe vinha por mar o mantimento, sustento dos cavalos, e seu, e pode também acontecer entrarem na dita serra quinhentos ou mil ou dois mil de cavalo, e depois saírem-se, e deixarem nela duzentos, e que só bastam para desbaratarem numa conjunção a um General, e Cidade.
Fim do Campo de Tangere, e de seus postos, entradas e desenfados.
The Royal City of Tangier with the lines and fortifications when it is was ataqued [sic] by ye Moores in May, 1680, The British Museum
Após a entrega de Tânger aos ingleses em 1662, o sistema de estruturação do Campo Exterior foi herdado pelos britânicos, que alteraram a sua filosofia, situação que se veio a verificar como fatal para a sobrevivência da cidade nas suas mãos. Foram construídos redutos e fortes exteriores, que implicavam uma ocupação permanente, diurna e nocturna, e uma apropriação intensiva do espaço. Essa situação obrigou a uma expansão das defesas sob a forma de trincheiras, que mobilizada homens e recursos de forma permanente, contrariando o princípio da ocupação restrita, que tão bons resultados dera durante quase dois séculos.
No ano de 1684 os ingleses abandonam Tânger no seguimento de um forte bloqueio imposto pelo Sultão Mulai Ismail.
Caro Frederico Mendes Paula,
Estou a terminar um livro sobre Tanger e gostaria de lhe fazer uma perguntas. Meu email está no formulário. Excelente trabalho de pesquisa.
Melhores cumprimentos,
Fernando Filipe
Parabéns! Excelente trabalho.
Obrigado. Cumprimentos
Magnifico estudo. A minha curiosidade vai mais para Tanger velho, tão importante ao tempo do 1º assalto. Posso usar a foto das teracenas num trabalho pessoal?
Obrigado. Pode usar a foto com certeza
Magnifico trabajo
Obrigado. Muito graças aos seus preciosos escritos. Abraço
Mais uma lição formidável sobre uma civilização diferente aqui mesmo ao lado.
Civilização que é um museu vivo do medievalismo.
Lerei avidamente a continuação destas lições.
Obrigado. O Campo Exterior, elemento tão importante na vida das Praças-fortes de Marrocos e que merecia ser melhor estudado.