O Rochedo do Diabo
No seguimento da construção da Fortaleza de Santa Cruz do Cabo Guer no ano de 1505, no local da actual cidade de Agadir, o capitão da praça João Lopes Sequeira, apoiado pela Coroa Portuguesa para fazer face às pretensões espanholas na zona, decide construir uma outra, alguns quilómetros mais a Norte, a que os portugueses chamaram Fortaleza de Ben Mirao ou Bom Mirão. O local escolhido foi um promontório situado na praia de Imourane, topónimo que está na origem do seu nome, junto à aldeia de Tamraght, um rochedo escarpado que entra 50 metros pelo mar adentro.
Local de forte rebentação e de difícil acesso, este rochedo, conhecido pelo nome de Rochedo do Diabo, encontra-se envolto em superstições e mistérios, e é palco todos os anos de um moussem que durante três dias atrai inúmeros visitantes e no qual se organiza um ritual que evoca uma curiosa lenda.
O Rochedo. foto Hanane
A Crónica anónima intitulada Este he o origem e começo e cabo da Villa de Santa Cruz do Cabo de Gue d’Agoa de Narba, traduzida e anotada por Pierre Cenival, refere a construção de Ben Mirao:
“E vendo João Lopes Girão (o autor refere-se a João Lopes Sequeira) a fonte de tão boa água fez ali assento (aqui o autor da Crónica refere-se a Santa Cruz do Cabo Guer na actual cidade de Agadir) e armou ali um castelo de pau que lavava já ordenado, e feito pôs-lhe artilharia e fez logo ao redor do castelo outro muito forte de pedra e cal, em que meteu a fonte dentro (o autor refere-se à famosa fonte de Agoa de Narba), e com artilharia defendia aos mouros que lhe não impedissem a obra e tanto que o acabou foi-se fazer outro castelo sobre uma rocha que estava apartada da terra defronte de uma outra vila de mouros que se chama Tamaraque a qual rocha a rodeava e batia o mar a qual chamavam Bom Mirão o qual lhe tomaram os mouros por traição, e com esta paixão, e enfadamento se veio a Portugal a El Rei D. Manuel, e vendeu-lhe o castelo do Cabo de Gue d’Agoa de Narba.” (SANTOS, SILVA e NADIR, 2007, p. 216)
As ruínas de Ben Mirao
As ruínas de Ben Mirao ainda se encontram no local, mas consistem apenas das fiadas inferiores de um muro que encerrava o rochedo do lado de terra. “Da estrutura portuguesa só restam as fundações, as fiadas inferiores, incluindo a soleira da porta da frente de terra. O castelo tirava vantagem do desenho do cabo para fechar a sua ligação à costa com uma barreira amuralhada. Uma cava, inundável na preia‐mar, acompanharia o muro na defesa da pequena fortaleza portuguesa.” (CORREIA, 2009, p. 332)
Pensa-se que a existência da fortaleza em mãos portuguesas foi de pouca duração, já que não consta das referências de 1513 que são feitas em relação à compra de Santa Cruz do Cabo Guer por D. Manuel de Portugal, da qual Ben Mirao dependia funcionalmente. No entanto constitui uma referência no conjunto das fortificações portuguesas em Marrocos, já que “o pequeno castelo inaugurava uma estratégia de implantação que viria a ser adoptada pela coroa portuguesa em latitudes meridionais da esfera magrebina e se caracterizava pela construção de castelos satélites de apoio às ocupações urbanas de maior dimensão.” (CORREIA, 2009, p. 332)
Os vestígios da muralha existente
A presença portuguesa no Rochedo do Diabo foi de facto muito curta, já que a fortaleza foi construída em 1505 (provavelmente), e, conforme já referido, não consta da lista de bens por si vendidos ao Rei de Portugal D. Manuel em 1513. Isto significa que, na melhor das hipóteses, os portugueses permaneceram no local durante um período máximo de 8 anos. Mas, de acordo com Ahmed Saber, da Faculdade de Letras de Agadir, os portugueses foram expulsos do Rochedo em 1505-1506 por tribos locais, o que significa que só permaneceram no local durante alguns meses.
De acordo com Omar Hamouche, membro do Conselho comunal de Tamraght, “este rochedo abrigava um forte português equipado com canhões e armas de fogo para repelir a população local que apoiava a campanha de Jihad levada a cabo pelos Saadis, sob o comando de Mohamed Cheikh, com o objectivo de libertar a costa e recuperar os férteis campos em torno da actual Imourane e que eram conhecidos nomeadamente pela qualidade das cenouras que aí eram cultivadas”. Mas Ben Mirao não foi conquistada por Mohamed Ach-Cheikh, já que ele só nasceu em 1490 e foi proclamado Sultão em 1544. A sua grande vitória sobre os portugueses foi a conquista de Santa Cruz do Cabo Guer (Agadir) em 1541.
Localização da Fortaleza de Ben Mirao
O Rochedo do Diabo é de facto uma península que se transforma em ilha na maré alta e pela análise do local, parece evidente que a Fortaleza de Ben Mirao não seria um castelo com uma estrutura semelhante aos restantes castelos construídos pelos portugueses na costa de Marrocos, já que apenas existem vestígios construídos precisamente do lado em que o rochedo liga com a terra e em que o terreno é de certa forma rampeado. É uma parede de alvenaria de pedra, com uma porta no seu eixo, obstruindo o acesso ao seu interior.
Os restantes lados do rochedo são escarpados e caem sobre o mar, constituindo uma muralha natural. Tudo leva a crer que seria uma fortificação com a mesma filosofia da que existe na Fortaleza de Sagres, com as devidas diferenças em termos de escala, é claro. Ou seja, o próprio rochedo em si era já uma fortaleza, havia apenas que fechar a sua comunicação com a terra.
Os restos de muralha existentes e a face Norte do Rochedo
As designações Ben Mirao e Imourane podem ter origem no nome Mourane, antiga divindade Amazigh do amor, ou em Amourrane, que significa resistência, ou ainda derivar do plural de Imri, que significa amante no dialecto local.
Reza a lenda do Rochedo do Diabo que as raparigas virgens que o visitavam, ao aproximarem-se de um buraco existente na sua superfície, uma espécie de poço que comunica com o mar, eram atraídas de forma irresistível para o seu interior, o que as impelia a atirarem-se à água. O senso comum afirma que a realidade é que essas raparigas se suicidavam por ordem do diabo.
O buraco mágico
A lenda foi entretanto interiorizada pela sociedade local e deu origem a um costume, segundo o qual as virgens que forem colocadas dentro do buraco e esperarem que sete vagas passem sob os seus pés, encontrarão marido e terão felicidade e fertilidade na sua vida conjugal. São os próprios pais que levam as filhas em idade de casar ao chamado “buraco mágico” e as suspendem, esperando que as sete vagas passem sob os seus pés. Prática perigosa, já que muitos deles, por pudor, evitam os períodos em que há gente por perto, inviabilizando uma eventual ajuda em caso de acidente, o que acontece com alguma frequência.
Mulheres no Rochedo do Diabo
Michel Terrier, no seu Agadir Blog, recolheu o testemunho de duas mulheres que descrevem esta prática:
“Majda Saber explica: ‘Desde há muito tempo, as mulheres tinham por hábito levar as suas filhas em idade de se casarem a esta ilhota. Vindo cedo de manhã e longe dos olhares, as mães escoltavam as suas filhas até um pequeno buraco situado num rochedo desta ilhota. O ritual era simples e ao mesmo tempo perigoso’. (…) ‘Duas mulheres seguravam firmemente a rapariga pelos ombros enquanto ela era exposta à força das vagas desfeitas que saíam pelo buraco’, explica Fadma, uma sexagenária. ‘As duas mulheres deviam segurar a rapariga com grande força para que ela não escorregasse pelo buraco. E era então que a rapariga expunha o seu corpo a sete vagas sucessivas sem falar nem se voltar. O resultado é garantido: várias raparigas casaram-se directamente após cumprirem este ritual’, clama ela. Porquê sete vagas? A pergunta parece não ter resposta e ‘é assim porque simplesmente assim faziam os nossos antepassados”. (TERRIER, 2013, página electrónica citada)
A praia de Imourane durante o moussem. foto Michel Terrier
O moussem, que se realiza no início de Setembro, integra-se no espírito dos grandes moussems do Suss marroquino, que celebram o final do ciclo anual da produção agrícola, afinal uma festa da fertilidade, na qual participam os membros das tribos vizinhas.
Tradicionalmente, o carácter profano das festas ultrapassava o simples conceito de celebração do ciclo da natureza, cumprindo um papel social importante, já que “eram uma ocasião de reconciliação entre as tribos e ofereciam um espaço de trocas e de encontros entre os jovens das diferentes aldeias, que frequentemente selavam casamentos no final desta manifestação.” (LE MATIN, 2013, página electrónica citada)
A festa tem também um carácter religioso e inclui uma romaria ao mausoléu de Sidi Mohamed Cheikh Ait Yazza Ouihda Albakri, onde um carneiro é sacrificado e tem lugar uma vigília.
La Fantasia – Moussem d’Imourane. por Marc d’Haenen
Para Ahmed Saber, da Faculdade de Letras de Agadir, a origem do moussem está intimamente ligada à guerra travada contra o ocupante português, celebrando a série de vitórias que os Sádidas obtiveram no início do século XVI sob o comando de Mohamed Cheikh, que supostamente marcaram a sua expulsão do local.
A fantasia é um dos momentos altos do moussem, iniciando-se ao final do dia e prolongando-se até ao por do sol.
“A arte da fantasia consiste em imprimir às montadas de um grupo de cavaleiros, chamado a Sorba, um galope de carga, o Baroud, e disparar um tiro de espingarda em uníssono no final da corrida. Os grupos mais hábeis conseguem que os seus tiros façam uma só detonação perfeitamente sincronizada. O efeito produzido é impressionante, sobretudo se nos encontrarmos frente aos cavaleiros, que param os seus cavalos mesmo antes de tocar na multidão. Este exercício é chamado a Talqa.” (D’HAENEN, 2012, página electrónica citada)
O buraco mágico do Rochedo. foto Michel Terrier
Mas o ponto alto do moussem é sem dúvida alguma o ritual que continua a atrair dezenas de raparigas casamenteiras ao buraco mágico. Cumprindo a tradição ancestral, essas raparigas, suspensas no seu interior, esperam que as sete vagas passem sob os seus pés, envolvendo-as numa nuvem de espuma e água pulverizada.
Após este banho de frescura, são içadas e estão prontas para o esperado noivado.
Muito interessante, obrigado
Ora essa! Cumprimentos
Bonjour
Il s’appelle mohamed mais pas ahmed
Choukran jazilan
Bonjour cher Mr
Je vous envoie ce message pour vous invite cest vous êtes au Maroc je suis le président
De l’association zawiya Mohamed cheikh ALBAKRI pour le meusem le 24et le25mars
Bonjour cher Monsieur
Merci beaucoup pour votre invitation. Incha Allah on pourra se rencontrer a Immourane cette année ou dans une autre occasion.
Bonjour
La zaouia a imourane il s’appelle sidi Mohamed
CHIKH ait IZZA OUIHDA ALBAKRI
Ond um carreiro e sacrificado e tem lagar UMA
Vigilia
MERCI
Merci pour votre précision. Ma As-Salam
A presença portuguesa no Rochedo do Diabo foi muito curta, já que a fortaleza foi construída em 1505 (provavelmente) por um comerciante e capitão da Praça de Santa Cruz do Cabo Guer chamado João Lopes Sequeira e, segundo Jorge Correia, não consta da lista de bens por si vendidos ao Rei de Portugal D. Manuel em 1513. Isto significa que, na melhor das hipóteses, os portugueses permaneceram no local durante um período máximo de 8 anos. Mas, de acordo com Ahmed Saber, da Faculdade de Letras de Agadir, os portugueses foram expulsos do Rochedo em 1505-1506 por tribos locais, o que significa que só permaneceram no local durante alguns meses. De acordo com Omar Hamouche, membro do Conselho comunal de Tamraght, “este rochedo abrigava um forte português equipado com canhões e armas de fogo para repelir a população local que apoiava a campanha de Jihad levada a cabo pelos Saadis, sob o comando de Mohamed Cheikh, com o objectivo de libertar a costa e recuperar os férteis campos em torno da actual Imourane e que eram conhecidos nomeadamente pela qualidade das cenouras que aí eram cultivadas”. Mas Ben Mirao não foi conquistada por Mohamed Ach-Cheikh, já que ele só nasceu em 1490 e foi proclamado Sultão em 1544. A sua grande (e única) victória sobre os portugueses foi a conquista de Santa Cruz do Cabo Guer (Agadir) em 1541. Após esta derrota, os portugueses abandonaram diversas Praças em Marrocos, como Safim, Aguz, Azamor, Arzila e Alcácer Ceguer.
Bonjour
J’aimerais bien descute avec vous
Au sujet de imorane a partir de
2015 le fountsia de meussem imorane
Dois respecte le cheikh sidi izza Albakri ait imni ouassif c’est Luis qui a fait la
Guerre à imorane
Il y’a même à l’époque un peur
A ifri. Imi edbirnne c’est la ou les
Portugais décharge les arme et les
Munition je suis petit Fisl de ce cheikh
Est ce que vous pouvais m’écrire
J’ai besoin de quelque Rensegnement
Pour savoir plus merci
La presence des portugais au Rocher du Diable a été très courte, vue que la forterresse était construite en 1505 (environs) par un comerçant de Santa Cruz do Cabo Guer nomé João Lopes Sequeira et, selon Jorge Correia, n’est pas comprise dans la liste des biens par lui vendus au Roi du Portugal D. Manuel en 1513. Ça veut dire que, dans le meilleur des cas, les Portugais y étaient pendant 8 ans maximum. Mais selon Ahmed Saber, de la Faculté de Lettres d’Agadir, les portugais étaient chassés du Rocher en 1505-1506 par les tribus locales, ce que voudrait dire que les portugais y sont restés a peine quelques mois. Selon Omar Hamouche, membre du Conseil communal de Tamraght, “ce rocher faisait office d’un fort portugais équipé de canons et d’armes à feu pour repousser la population locale qui n’avait pas tardé à soutenir la campagne du Jihad menée par les Saâdiens, sous la conduite de Mohamed Cheikh, en vue de libérer les côtes et récupérer les champs fertiles attenant à l’actuelle Imourane et qui étaient connus notamment pour la qualité des carottes qui y étaient cultivées”. Mais Ben Mirao n’était pas conquérit par Mohamed Ach-Cheikh, car il était né en 1490 et seulement proclamé Sultan en 1544. Sa grande (et seule) victoire sur les portugais était la conquête de Santa Cruz do Cabo Guer (Agadir) en 1541. Après cette défaite, les portugais ont abandonné plusieurs places au Maroc, comme Safi, Souira Qadima, Azemmour, Asilah et Qsar Seghir.
Muito interessantes todos os artigosque disponibiliza. Trata-se se mduvida de um contributo muito valido para o conhecimento da teia de relações que se estabeleceram ao longo dos seculos entre Marrocos e Portugal e que deixou marcas nos dois países.
Marrocos aqui tão perto. Uma história comum tão determinante para a identidade dos dois países e tão desconhecida dos seus cidadãos.
Sem duvida alguma. É como refere. Por motivos profissionais acompanho este país desde 2007 e rem permanencia desde o inicio de 2014. É impressionante o quanto tenho conhecido de Portugal por estar em Marrocos (os vocabulos arabes; Oxalá, Alcantara, azeite, azeitona, etc e etc), a atitude e postura das pessoas e este fim de semana passado uma visita ao Douar Souaken em cuja planicie vizinha Portugal foi confrontado tragicamente com a sua desarrazoada ambição. A Batalha dos 3 reis deixou marcas nos dois países. Será a vontade de esquecer esse momento que nos faz ignorar essa história comum?